28 de setembro de 2020

Horizonte, Lua Brilhante, Sabre — Capítulo 01

Capítulo 1
O Homem no Horizonte

O sol estava se pondo no oeste.
Fu Hongxue ficou sozinho sob o sol poente. Era como se ele fosse a única pessoa em todo o mundo.
Estava frio e árido por mil milhas ao redor; parecia que até o sol poente havia mudado de cor por causa da sua solidão, mudando para um branco acinzentado que era triste e desolado.
Ele sentia o mesmo.
Sua mão apertou um sabre; um punho branco pálido com um sabre preto como breu!
Branco pálido e preto como breu eram cores próximas da Morte! E a morte era o limite do vazio e da solidão!
Seus olhos estavam solitários e vazios; eles podiam quase ver a morte.
Poderia ser a morte bem ali diante dos seus olhos?
Ele estava andando. Ele andava bem lentamente, mas nunca parava. Mesmo que a Morte estivesse esperando ele na frente, ele nunca pararia.
Sua postura andando era estranha e única; o pé esquerdo daria um passo rápido à frente e o pé direito o seguiria lentamente. Ele parecia andar com uma considerável dificuldade. Mesmo assim, ele havia caminhado incontáveis quilômetros, feito inúmeras jornadas; e ele percorreu toda a estrada sozinho, passo a passo.
Quando ele poderia parar de andar assim? Quando ele poderia sequer parar de andar?
Ele não sabia. De fato, ele nunca tinha considerado isso!
Agora que ele chegou aqui, o que há além? A Morte estava realmente na frente? Definitivamente! Seus olhos continham a Morte, sua mão também agarrou a Morte; na verdade, seu sabre representava a Morte!
Era uma lâmina preta como breu, com um cabo preto como breu e uma bainha preta como breu.
Seu sabre pode representar a morte, mas era a sua vida inteira!
O céu ficou ainda mais escuro, mas ainda assim ele podia ver a presença de uma pequena cidade ao longe.
Ele sabia que era o Assentamento Fênix, uma das mais populosas cidades na área remota. Claro que ele sabia, porque era onde a morte que ele estava procurando poderia ser encontrada.
Mal ele sabia que o Assentamento Fênix já estava morto!
.....
As ruas não eram muito longas ou muito largas, mas mesmo assim tinha muitas lojas, barracas e casas ao longo delas.
Haviam incontáveis cidades assim no mundo, e cada uma delas era igual; ruas com muitas lojas, barracas e casas; e essas barracas tinham vitrines dilapidadas, bens baratos e mercadores honestos. Nas casas viviam bondosas e amigáveis pessoas. Contudo, Assentamento Fênix era diferente dessas outras cidades. Enquanto as lojas, barracas e casas continuavam presentes, não tinha ninguém por ali.
Ninguém, nem uma única pessoa estava estava ali.
Haviam portas e janelas que se alinhavam em ambos os lados da rua. Algumas estavam fechadas, mas todas estavam quebradas, destruídas. Pilhas grossas de poeira cobriam as ruas, dentro e fora das casas e lojas. Os telhados e vigas estavam cheios de teias de aranha. Um gato preto assustou-se com os passos e saltou, mas já tinha perdido o estado de alerta e agilidade. Estava ofegando e mancando enquanto rastejava pela rua; nem parecia mais um gato.
Não era um fato bem conhecido que a fome poderia mudar tudo?
Será que o gato era a única criatura sobrevivente nessa pequena cidade?
O coração de Fu Hongxue gelou, ainda mais frio do que a lâmina em sua mão.
Ele estava presente nessa rua, vendo tudo com seus próprios olhos. Mas ele não podia acreditar, não ousava acreditar e não queria acreditar.
Que desastre se abateu sobre este lugar?
Como essa tragédia ocorreu?
Na lateral da rua, uma velha placa rangia ao vento. Ele ainda conseguia distinguir as palavras por trás de toda aquela poeira "Taverna da Família Chen, o Melhor Vintage da Cidade!"
Esta era originalmente uma das placas de sinalização mais bonitas do distrito, mas agora estava esfarrapada e quebrada, assim como os dentes de pessoas idosas.
Mas o estado da taverna era muito pior do que o da placa.
Fu Hongxue ficou em silêncio, observando e esperando. Quando o vento diminuiu, ele andou até a taverna e abriu a perna. Foi como se ele tivesse entrando em uma sepultura que havia sido exumada.
Ele já tinha estado aqui antes!
Embora o vinho nem sequer fosse bom, muito menos o vintage, pelo menos não era vinagre. E o lugar parecia bem longe de ser um túmulo.
Há exatamente um ano, este lugar ainda era um estabelecimento movimentado. Viajantes de todas as partes que passassem pelo Assentamento Fênix seriam atraídos pela placa do lado de fora e parariam para tomar um drinque aqui.
Uma vez que o vinho entrava no estômago vazio, as pessoas começavam a tagarelar. Portanto, a taverna era sempre barulhenta. Tavernas barulhentas atraíam as pessoas.
A taverna não era muito pequena, mas estava sempre lotada. O dono da taverna era muito simpático e sempre aparecia com um sorriso no rosto.
Mas o sorriso havia desaparecido, mesas limpas tornaram-se tampos cheios de poeira; o chão estava coberto de garrafas de vinho quebradas e o cheiro aromático do vinho havia se transformado em um odor pútrido que induzia ao vômito.
Risos, tagarelice, bebendo vinho na taverna; tilintar de baldes e facas, e óleo fervendo em woks atrás da taverna; esses sons todos desapareceram. Apenas os rangentes sons de janelas quebradas e painéis balançando ao vento sobraram; e eles lembravam estranhamente o bater das asas de morcegos em prisões.
Os céus escureceram ainda mais; era quase preto como breu.
Fu Hongxue andou lentamente até um canto e se sentou sem pressa, com suas costas em direção à porta.
Aquele era o canto no qual ele sentou quando veio aqui um ano atrás. Mas o lugar agora parecia uma sepultura; não havia lugar para qualquer pessoa viva ficar.
Por que ainda assim ele escolheu se sentar? Ele estava lembrando sobre o passado? Ou ele estava esperando?
Se ele estava se lembrando, o que pode ter acontecido para merecer sua lembrança?
Se ele estava esperando, quem ou o que ele estava esperando?
Era a Morte? Era realmente a Morte?
.....
A cor da noite havia finalmente envolvido seus braços em volta de toda a terra. Não haviam lâmpadas, velas ou fogo; apenas escuridão.
Ele odiava a escuridão. Contudo, a escuridão era similar à noite, no sentido de que não havia como escapar de ambas.
Agora que a escuridão havia chegado, e a morte? Ele sentou ali sem se mover, sua mão continuou agarrando firmemente o sabre. Apesar de ainda poder-se ver a mão pálida, não era o mesmo com o sabre, que se fundiu com a escuridão.
Seria o sabre dele tão inescapável quanto a morte?
A noite estava silenciosa como a morte. Repentinamente, o vento trouxe os melodiosos acordes de uma música instrumental de cordas.
Sob circunstâncias tão deprimentes, era difícil que a música estivesse vindo dos céus.
Seus olhos vazios tinham uma estranha expressão depois de escutar essa música celestial. - Muitos adjetivos poderiam ser usados para descrever essa expressão, mas alegria não era um deles.
A música firmemente aumentou em volume. Junto ao aumento do volume da música, o rangido das rodas de uma carruagem também podiam ser ouvidos.
Quem mais além de Fu Hongxue poderia estar correndo para esse lugar esquecido por Deus?
Os olhos de Fu Hongxue foram lentamente retornando à sua original frieza, mas a mão que estava no seu sabre agarrou ainda mais forte.
Poderia ser que ele conhecia a pessoa que estava vindo?
Poderia ser que ele estava esperando por essa pessoa?
Poderia ser que essa pessoa era a própria Morte?
Como qual tipo de música a música celestial soava? Ninguém jamais escutou como a música celestial se parecia.
Mas se existisse uma forma de música que pudesse derreter o coração de alguém, e até mesmo sua alma, essa música seria o mais próximo de uma música celestial que poderia ser ouvida na terra. A música que Fu Hongxue estava escutando certamente se qualificaria pra ser música celestial.
Mas Fu Hongxue não derreteu.
Ele sentou ali escutando, mas permaneceu imóvel e quieto. De repente, oito homens vestidos com casacos pretos com faixas de seda coloridas amarradas à cintura entraram na taverna em passos rápidos. Todos eles carregavam cestos de bambu; essas cestas continham itens peculiares, incluindo trapos de pano e vassouras.
Nenhum deles parou pra olhar Fu Hongxue. Uma vez na taverna, eles começaram a limpá-la e arrumá-la. Todos eles trabalharam rapidamente.
Eles não apenas trabalharam rapidamente, como também foram muito eficientes.
A taverna dilapidada teve uma transformação milagrosa em um período muito curto de tempo.
Cada recanto e fenda foram limpos até que não restasse um grão de poeira. O papel de parede foi colocado e contas penduradas na frente das molduras das portas. Havia toalhas de mesa em todas as mesas e até um tapete vermelho no chão. Apenas o canto que Fu Hongxue estava sentado permaneceu intocado.
Assim que os oito homens terminaram a limpeza, eles pararam em posição de sentido perto da entrada da taverna. Quatro mulheres vestidas com cores vivas entraram na taverna, segurando cestas de bambu. Elas colocaram flores frescas, comida e vinho sobre uma mesa.
Uma fileira de músicos de cordas entrou, tocando uma bela música.
Uma única batida de tambor podia ser ouvida entre a música. Já era meia-noite. Da janela, uma figura solitária podia ser vista, vestida de branco, segurando o tambor de um vigia. Ele parecia um espírito sozinho na escuridão.
De onde veio esse vigia noturno?
Estava ele constantemente lembrando as pessoas da vinda da morte?
De quem ele estava lembrando dessa vez?
Depois que a reverberação do tambor do vigia terminou, a música começou:
"A estrada para o horizonte, Um caminho sem volta, O homem quebrou sua alma no horizonte, Mas a alma foi quebrada antes de chegar no horizonte..."
A música ainda não havia terminado. Mas um Yan Nanfei aparentemente bêbado já estava entrando na taverna.

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